quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

Aula expositiva sobre o Distributismo



Aula sobre o tema do Distributismo e Chesterton

Palestrante: Guilherme Freire

Realizado no Círculo de Estudos Políticos









Chesterton e o distributivismo



Artigo original: Revista Vila Nova

Guilherme Freire


“Nossa sociedade é tão anormal que o homem normal nunca sonha em ter a ocupação normal de cuidar se sua própria propriedade. Quando ele escolhe um negócio, ele escolhe um, entre milhares de negócios, que envolve cuidar da propriedade dos outros.” G.K. Chesterton

Inspirado pela encíclica do Papa Leão XIII, Rerum Novarum, o filósofo e jornalista inglês Gilbert Keith Chesterton divulgou e ajudou a criar uma forma de pensar a economia baseada na Doutrina Social da Igreja Católica. O estudo foi feito na esperança de recolocar a família e as pequenas propriedades no centro da organização econômica da sociedade. Essa escola de pensamento foi chamada de distributivismo (ou distributismo).

O distributivismo não pode ser confundido com a estatização dos meios de produção, ou sua redistribuição forçada pelo Estado, que seria socialismo. Trata-se da distribuição natural da riqueza que se dá quando a produção já se encontra descentralizada. A idéia é priorizar empresas familiares de qualquer espécie, ou firmas cuja propriedade é dividida entre os empregados (como cooperativas), ou ainda pequena empresas e empresas de médio porte com atuação local. Também pequenas iniciativas privadas e trabalhos independentes, em geral, correspondem a essa descentralização da economia.

Essa defesa das pequenas propriedades, na perspectiva distributivista, não se dá por meio da força ou da coação. Na encíclica Rerum Novarum, Leão XIII diz que os socialistas, na medida em que violam o direito de propriedade, e usam a força para promover igualdades, criam uma elite mais poderosa que a elite anterior. Juntando o poder econômico com o poder político, a nova elite concentra ainda mais a propriedade. Chesterton completa dizendo que “Nenhuma sociedade pode sobreviver da falácia socialista de que existe um número absolutamente ilimitado de autoridades inspiradas e uma quantidade absolutamente ilimitada de dinheiro para pagá-las”.

A descentralização também não se dá por meio de um liberalismo fora de perspectiva. Se o único valor do indivíduo for a vitória do mundo capitalista – jogando a caridade no lixo –, esse mesmo indivíduo pode perfeitamente usar essa vitória, não para prestar serviços e fornecer bens dos quais as pessoas precisam, mas para colocar em uma péssima situação seus trabalhadores, ou para destruir o próprio sistema capitalista. É o que acontece quando, por exemplo, George Soros financia partidos e causas socialistas (Soros e os Rockefellers são a personificação viva da frase “Capitalismo demais não significa capitalistas demais, mas capitalistas de menos”).

Autor de um grande livro sobre São Tomás de Aquino (capaz de arrancar elogios imensos de Étienne Gilson), Chesterton tirou muitas coisas da obra do Doutor Angélico, inclusive as bases teóricas para desenvolver uma visão da economia que nem caísse na usura, e nem no autoritarismo. Essa influência foi ressaltada no Brasil por Gustavo Corção, autor do clássico “Três alqueires e uma vaca”.

Foi de certa forma, por influência de São Tomás, que toda essa escola de pensamento ligada à Doutrina Social da Igreja conseguiu ser refinada intelectualmente. De Tomás veio a idéia segundo a qual não se deve buscar justiça por meio da violência ou do isolamento, mas sim de maneira prudente e caridosa ou, por outra, buscar que cada indivíduo tenha seus meios de autossuficiência e sua propriedade, evitando a criação de uma classe de dependentes.

Tendo propriedade o indivíduo obtém uma liberdade que não tinha. Já dizia Chesterton que ao dar dez libras a um indivíduo você não lhe tirou uma liberdade, você lhe deu a liberdade de fazer o que bem entender com essas dez libras.

É claro, como escola de pensamento econômico, o distributivismo só faz sentido à luz de uma visão de mundo abrangente, personalista e atenta às comunidades. Curiosamente a palavra economia originalmente remontava a idéia de administração doméstica, e não a essa obsessão por macroeconomia que vemos hoje.

Entre outras coisas, o distributivismo acaba sendo uma grande apologia da iniciativa privada, pois espera aumentar o número de possuidores de propriedade privada, estimulando os indivíduos e as famílias a adquirir ou criar seus próprios meios de produção, em vez de depender de salários. Essa é a idéia por trás dos “três alqueires e uma vaca” e não um programa assistencialista estatal. Em outras palavras, é melhor ajudar e incentivar que todos a tenham e cuidem de uma vaca do que criar um programa “bolsa dos sem-vaca”. Claro, as vacas e os alqueires dos dias de hoje muitas vezes são pequenas empresas, lojas ou apartamentos.

Justamente por buscar restabelecer a vida microeconômica – o comércio local –, o distributivismo é um movimento que acaba aparecendo em oposição ao que pode haver de nocivo no globalismo.

Embora a globalização tenha seus postos positivos (ideologia que visa fortalecer administrações internacionais), ela pode tornar perigosamente frágeis as políticas locais, comprometendo a possibilidade de contato da vida pública com o cidadão comum. Muitas empresas hoje são dependentes ou estão envolvidas de maneira suspeita com governos e organismos internacionais, impossibilitando o que poderia ser uma verdadeira livre iniciativa.

Qualquer pessoa que pense que “livre iniciativa” quer dizer fábricas no Vietnã ou legiões de chineses pagos com salários irrisórios, trabalhando em benefício de acionistas de Wall Street, ou de capitalistas do Partido Comunista Chinês, estará errando feio. Algo muito errado está acontecendo, quando muitos estão sem emprego e alguns poucos repousam sobre uma carteira de ações bilionárias, construída em grande parte com trabalho quase escravo, sustentando uma ditadura na Ásia e ONGs gigantes que trabalham para suprimir a liberdade individual no ocidente.

No entanto, é compreensível que a clássica objeção levantada contra essa distribuição de propriedade seja a existência de atividades que aparentemente demandam grandes organizações. Por exemplo, empresas de automóveis ou de aviões, para as quais são necessárias fábricas grandes. Ocorre que nenhumas dessas atividades necessitam de um monopólio (do ponto de vista da economia liberal isso é indesejável, por sinal), e nada exclui a possibilidade de serem montadas cooperativas.

Um exemplo de cooperativa hoje se encontra no país Basco, na pequena cidade de Mondragón, onde o padre José María Arizmendiarrieta fundou diversas cooperativas. Os funcionários têm interesse em produzir mais, e ainda mais interesse no lucro da empresa, porque são eles, de certa forma, os próprios donos. Essas cooperativas já prosperaram tanto, que hoje a corporação de Mondragón forma um dos maiores complexos industriais da Espanha.

Além disso, os funcionários não vivem sobre constante ameaça de demissão, e nem têm interesse em conflitos com sucessivas greves. Eles voluntariamente assumem as posições de direção na cooperativa, sem precisar receber remunerações adicionais. De certa forma, Mondragón seguiu o que Chesterton disse: “Fazer o locatário e o locador a mesma pessoa tem certas vantagens, tal como o locatário não pagar o aluguel e o locador não trabalhar muito.”. Isso reduz os problemas que podemos ter com as associações sindicais de hoje, como as brigas entre sindicatos, ou dos patrões com os empregados.

O distributivismo pressupõe a liberdade econômica dos liberais, e a adesão a princípios e valores atemporais dos conservadores. Para esse tipo de reforma não é suficiente a ausência de um governo excessivo, mas também deve estar presente o espírito da caridade.

Nada resume tão bem isso quanto à história do economista E.F Schumacher, autor de Small is Beautiful. Ele se converteu ao catolicismo após ler uma Encíclica diferente do que geralmente se espera, a Humanae Vitae, de Paulo VI. Diz ele que essa é a encíclica da Igreja que protege os pequenos, que defende aqueles que ainda não podem se defender. De todas as reformas que podem ajudar a economia, a mais urgente, creio que os maiores distributivistas concordariam, é a dos espíritos.



segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

O que é Distributismo?



Artigo original: The Distributist Review 

Livre tradução do Editor


Grande parte da história do Ocidente, desde meados do século XIX, foi a história de dois sistemas econômicos adversários. Desde o Manifesto do Partido Comunista, de 1848, que declarava que “um espectro ronda a Europa”, que de fato, anda um espectro não somente sobre a Europa, mas sobre o mundo inteiro. Não se trata apenas do espectro do comunismo, mas de sistemas econômicos e sociais rivais, que por várias vezes abalaram a humanidade. Mas nas mentes de muitos, esta rivalidade entre os sistemas econômicos chegou ao fim: o comunismo e o socialismo ambos foram derrotados, e, portanto, só resta ao capitalismo reinar triunfantemente em todo o mundo. No entanto, este não é o caso. Numa passagem negligenciada da Encíclica Centesimus Annus, João Paulo II realça que as escolhas da humanidade não estão limitadas ao capitalismo e ao comunismo,agora desacreditado. “É inaceitável a afirmação de que a derrocada do denominado «socialismo real» deixe o capitalismo como único modelo de organização econômica” (nº. 35). Sendo assim, os católicos deveriam conhecer o distributismo, um sistema econômico defendido por algumas das melhores mentes da Igreja, na primeira parte do século XX, homens como G. K. Chesterton, Hilaire Belloc, Padre Vincent McNabb e muitos outros. Vejamos o que é o distributismo e porque muitos católicos o consideram mais semelhante ao pensamento católico do que o capitalismo.

Em primeiro lugar, devemos estabelecer algumas definições dos principais termos que iremos utilizar, especialmente o de capitalismo. Muito frequentemente esta palavra não é definida, e cada pessoa lhe dá um significado, bom ou mau, conforme as suas próprias crenças, nunca a definindo claramente. Então, o que o capitalismo não é? O capitalismo não é a posse privada de propriedade, mesmo que se trate de propriedade produtiva, pois tal tipo de propriedade existe na maior parte do mundo desde tempos muito remotos, enquanto que o aparecimento do capitalismo é normalmente situado na Europa do final da Idade Média. Talvez a melhor maneira de proceder seja escolher a definição de uma autoridade, e depois analisaremos como é que se enquadra com os fatos históricos. Viraremos a nossa atenção para a Encíclica Quadragesimo Anno (1931), do Papa Pio XI, em que o capitalismo é definido, ou caracterizado, como sistema “em que ordinariamente uns contribuem com o capital, os outros com o trabalho para o comum exercício da economia”. Por outras palavras, no sistema capitalista normalmente trabalha-se para outra pessoa. Alguém, o capitalista, paga a outros, os trabalhadores, para que trabalhem para ele, e recebe os lucros do seu empreendimento, isto é, o que sobra depois de pagar o trabalho, as matérias-primas, custos administrativos, débitos etc.

Será que não há nada de errado com o capitalismo, com a separação entre propriedade e trabalho? Não há nada de errado em ter uma fábrica ou uma fazenda e empregar outros para trabalharem nelas, desde que lhes pague um salário justo. No entanto, o sistema capitalista é perigoso e imprudente, e seus frutos têm sido nocivos para a humanidade, e os Sumos Pontífices têm apelado a mudanças que, ou iriam eliminar o capitalismo, ou pelo menos reduzir seu alcance de poder.

Deixem-me explicar e justificar as afirmações que acabo de fazer. E para o fazer, preciso primeiro  realizar um breve desvio para discutir o propósito da atividade econômica. Por que Deus deu ao homem a necessidade e a possibilidade de criar e utilizar bens econômicos? A resposta é óbvia: precisamos desses bens e serviços, a fim de levarmos uma vida humana. Assim, a atividade econômica produz bens e serviços para o bem de servir toda a humanidade, e todos ordenamentos econômicos devem ser julgados pela sua capacidade de preencher este objetivo.

Quando a propriedade e o trabalho estão separados, necessariamente deve existir uma classe de homens, os capitalistas, que estão afastados do processo de produção. Os acionistas, por exemplo, comumente não se preocupam em saber o que a própria empresa, da qual eles são proprietários formais, faz ou produz, pois só lhes interessa saber se o preço das ações estão subindo, e quanto vão ganhar com isso. De fato, na bolsa de valores, as ações mudam de mãos milhares de vezes ao dia, ou seja, diferentes indivíduos ou entidades, tais como fundos de pensões, são proprietários de parte de empresas por alguns minutos, horas ou dias, e em seguida as ações são vendidas,  tornando-se donos de outra entidade qualquer. Naturalmente esta classe de capitalistas passa a encarar o sistema econômico como um mecanismo pelo qual dinheiro, ações, títulos e outros substitutos de riqueza real podem ser manipulados para enriquecimento pessoal, ao invés de servir a sociedade, produzindo bens e serviços. Em resultado disto, têm-se feito fortunas através de takeovers hostis, fusões, fechamento de fábricas etc., em outras palavras, aproveitam do direito a propriedade privada, não para se envolverem em atividades econômicas produtivas, mas para se enriquecerem independentemente dos efeitos sobre os consumidores e trabalhadores.

Os Papas realmente justificaram a posse de propriedade privada, mas se analisarmos os motivos e os argumentos do porquê, constataremos que a sua lógica está muito longe da capitalista. Examinemos, por exemplo, a famosa passagem da Encíclica Rerum Novarum (1891), do Papa Leão XIII.

“[Quem]trabalha em terreno que é seu redobra o seu ardor e a sua aplicação. Chega a pôr todo o seu amor numa terra que ele mesmo cultivou, que lhe promete a si e aos seus não só o estritamente necessário, mas ainda uma certa fartura.” (nº 28)

Mas, o que acontece sob o capitalismo? Os homens aprendem a amar os certificados das ações que lhes renderão dinheiro, em resultado do trabalho de outra pessoa? A justificação que os Papas sempre fizeram da propriedade privada está ligada, ao menos idealmente, à unidade entre a propriedade e o trabalho. Acrescenta Leão XIII: “Importa, pois, que as leis favoreçam o espírito de propriedade, o reanimem e desenvolvam, tanto quanto possível, entre as massas populares” (Rerum Novarum, nº 28), e este ensinamento é repetido por Pio XI na Quadragesimo Anno (nº 3 “REDENÇÃO DOS PROLETÁRIOS” e nº 4 “O JUSTO SALÁRIO”), por João XXIII em Mater et Magistra (números 85-89, 91-93, 111-115), e por João Paulo II em Laborem Exercens (nº. 14). Se “o espírito de propriedade entre as massas” conduzir a um maior nível de proprietários, então a separação fatal entre trabalho e propriedade será, se não eliminada, reduzida em poder de influência. Já não será a característica fundamental do nosso sistema econômico, mesmo que continue a existir.

Isso nos conduz diretamente ao distributismo. Porque distributismo nada mais é do que um sistema econômico em que a propriedade privada está bem distribuída, no qual o maior número possível é, de fato, proprietário. A melhor exposição sobre o distributismo pode, provavelmente, ser encontrada no livro de Hilaire Belloc, An Essay on the Restoration of Property (1936). Atente-se no título, “A Restauração da Propriedade”. Os distributistas argumentaram que no regime capitalista, a propriedade produtiva tornou-se prerrogativa apenas dos ricos, e que isto lhes deu um poder e influência sobre a sociedade muito maior do que aquilo a que tinham direito. E embora formalmente todos tenham o direito à propriedade privada, no capitalismo, na prática ela está restrita aos ricos.

Outra característica do distributismo, é que numa economia de propriedade distribuída, haverá limites sobre a acumulação de propriedade. Antes que nos acusem de que isto parece socialismo, devemos recordar o comentário de Chesterton (em “O Que Há de Errado Com o Mundo”, cap. 6), de que a instituição propriedade privada não significa o direito ilimitado à propriedade, tal como a instituição casamento não significa o direito ilimitado à esposas. 

Na Idade Média, as Corporações de Ofício, exemplo perfeito das instituições católicas, frequentemente limitavam a quantidade de propriedade que cada dono/trabalhador podia ter (por exemplo, limitando o número de empregados), precisamente no interesse de evitar que alguém expandisse demasiadamente o seu negócio, levando outros à falência. Porque, se a propriedade privada tem um objectivo, como Aristóteles e Santo Tomás insistiriam, é assegurar que cada homem e a sua família possam levar uma vida digna, servindo a sociedade. Mas uma vida digna, e não duas ou três. Se o meu negócio me permite sustentar a mim e minha família, então que direito tenho eu de expandi-lo, privando outros do meio de sustentarem a si e suas famílias? Pois os medievais viam àqueles que se dedicavam às mesmas atividades não como rivais, ou concorrentes, mas como irmãos, irmãos empenhados no importante trabalho de oferecer ao público bens e serviços necessários. E como irmãos uniam-se nas corporações, haviam padres para rezarem pelos seus mortos, fundos de segurança para amparar as viúvas e os órfãos, e de modo geral, olhavam pelo bem-estar uns dos outros. Quem é capaz de admitir que esta concepção de sistema econômico não é mais conforme à Fé Católica do que a ética selvagem do capitalismo?

Percebo que muito do que digo aqui soe estranho a muitos leitores. A maioria dos americanos estão familiarizados apenas com o capitalismo e o socialismo. Mas um pouco de conhecimento sobre a história econômica Católica, e o pensamento econômico tradicional da Igreja, serão suficiente para convencer qualquer leitor sensato que há, para além da dicotomia moderna capitalismo-socialismo, um genuíno pensamento Católico quase desconhecido nos Estados Unidos. E se a atual "ciência" da economia contradiz esse pensamento, então pergunte a si mesmo: que autoridade essa "ciência" tem? Ela surgiu a partir da filosofia deísta dos autoproclamados Iluministas do século XVIII, o que torna curioso que alguns católicos, enquanto condenam (com razão) a filosofia desse século infeliz, abraçam entusiasmadamente suas teorias econômicas, não percebendo que essas teorias surgem a partir do mesm veneno destilado por Voltaire e os Enciclopedistas. Mas não é tarde demais para refazer o nosso pensamento, de acordo com o modelo de Jesus Cristo e de sua Igreja – se estamos dispostos a banir de nossas vidas os ídolos que são adorados em nosso próprio país e embarcar na viagem fascinante de descoberta do pensamente econômico Católico. 


Thomas Storck 

O articulista é autor de “Foundations of a Catholic Political Order” e “The Catholic Milieu”. E também membro do conselho editorial de “The Chesterton Review”.



domingo, 1 de dezembro de 2013

DISTRIBUTISMO


Perguntas mais frequentes


Texto original: The Distributist Review 

Livre tradução do Editor


O que é Distributismo?

O Distributismo tem suas raízes nas teorias sociais e econômicas articuladas nos documentos dos pontífices católicos, começando com o Papa Leão XIII, na "Rerum Novarum". Essas encíclicas sociais trazem imperativos para as transações econômicas e suas relações com o trabalho, solidariedade, salários, ampla difusão da propriedade e os limites apropriados à tecnologia. O Distributismo é um sistema econômico de acordo com os princípios desses documentos, e é centrado na mais vasta posse de propriedade possível, como a melhor garantia da liberdade política e econômica. Uma família que tenha sua própria terra ou suas próprias ferramentas pode levar sua vida sem ser dependente de um emprego oferecido por terceiros. Assim, o Distributismo almeja estender a propriedade para o maior número possível de proprietários, e acabar com a concentração da propriedade nas mãos de poucos capitalistas, ou do Estado.

O que são os 'meios de produção'?

Meios de produção são terra, ferramentas e equipamentos necessários ao trabalho de transformação de materiais brutos em bens e serviços. Como riqueza (bens ou serviços) somente é possível pela combinação dos meios de produção, trabalho e matérias-primas, acreditamos ser melhor quando são adquiridos em modelo de cooperativa (de propriedade do trabalhador) ou inteiramente operados pela família.

Vocês são Capitalistas ou Socialistas?

Nenhum dos dois. Capitalismo - ou proletarianismo - é um sistema baseado na maximização do retorno dos investimentos, e busca isso à custa do trabalho e do bem comum. O Socialismo busca eliminar a propriedade e colocá-la nas mãos de um governo impessoal e centralizado. Ambos sistemas - Capitalismo e Socialismo - limitam a real propriedade na prática. A única diferença entre um Estado socialista e um capitalista é se o poder está concentrado em poucas mãos privadas ou burocráticas.

Então vocês não apoiam um "Governo Grande/Estado Grande"?

Distributistas são descentralistas, que acreditam que a maioria das funções organizacionais (negócios, governo ou trabalho) deveriam ocorrer no menor nível de competência possível (subsidiariedade). Instituições como cooperativas e governos locais contribuem para a redução dos controles excessivos em larga escala, sejam eles burocráticos ou comerciais.

O que tem a ver com justiça?

Desde os tempos de Aristóteles os filósofos e economistas consideram a justiça como um elemento integrante do mercado; um fator a ser considerado antes que as trocas se efetivem. Todavia, durante o período da história conhecido como Iluminismo, surgiu o equívoco de que a justiça social viria somente por meio das "forças do mercado", ou do planejamento centralizado pelo governo. Nesse caso, o homem se torna uma mera engrenagem na máquina da economia, ele é reduzido a uma insignificância material que desconsidera sua natureza decaída ou telos (propósito). Assim, reconhecemos a dependência do homem aos bens materiais, reconhecemos que o comércio e as políticas sociais devem estar subordinados à sua vocação virtuosa.

Não seria o Distributismo menos eficiente, tornando a todos mais pobres?

Embora o capitalismo afirme ser altamente "eficiente", ele não funciona tão bem sem massivas despesas e intervenções governamentais. Os distributistas afirmam que a propriedade produtiva é uma geradora genuína de riqueza, porque serve e sustenta a família materialmente (comida, roupa e abrigo), e cultiva a alma através do trabalho. Ademais, evidencia-se que a propriedade distribuída é na verdade mais eficiente e menos dependente de enormes conglomerados governamentais ou corporativos. A propriedade significa liberdade para as famílias em relação à volatilidade financeira; partindo da perspectiva dos proprietários, a terra transcende os valores de mercado, devido à sua indispensabilidade para a estabilidade da família.

Qual é a sua posição em relação à nossa atual crise econômica?

Salários estagnados, usura, especulação, derivativos, desperdício e dívidas dos consumidores são somente uma parte dos problemas que transformaram uma terra de pequenos negócios e pequenos fazendeiros em uma nação dividida entre corporações entregando suas responsabilidades aos contribuintes e um governo complacente com os empregos sendo enviados ao exterior. Com relativamente poucos produtores e mais produção terceirizada, a confiança da família em obter alimentos saudáveis, salários justos, casa própria, serviços de saúde e educação apropriada para seus filhos através do emprego, entrou em colapso.

Como o Distributismo planeja nos ajudar a restabelecer a sanidade econômica?

Nós acreditamos que um renascimento da economia local irá reparar o dano causado pelas grandes empresas que pressionam o governo por maiores subsídios do erário público. O Distributismo avança com uma economia humana e uma política social investida nas necessidades da família, através da posse da propriedade e tecnologia sob medida. Nossos objetivos incluem a restauração do sistema de cooperativas, o apoio a negócios familiares, a promoção empresarial nas propriedades dos trabalhadores, empréstimos de microcrédito, apoio a agricultura comunitária e a associações encarregadas de implementar programas de produção vigorosos. Apoiamos iniciativas políticas para favorecer políticas de tributação diferenciadas, assistência jurídica para os negócios caseiros, assim como a revisão de práticas dos setores contábil e bancário. Pretendemos atingir nossos objetivos formando um movimento popular de acadêmicos e leigos, trabalhando juntos para criar seções regionais dedicadas à execução do programa Distributista.

Isso tudo não é muito utópico?

Não, o Distributismo é um sistema prático, que é validado por vários exemplos de empresas Distributistas em funcionamento; em pequena escala, existem milhares de empresas baseadas em casa e de posse dos seus trabalhadores, bancos de microcrédito, cooperativas de crédito, e companhias de seguros; em grande escala, há a corporação de cooperativas Mondragón, na Espanha, uma das mais bem sucedidas cooperativas na Europa, e a economia Distributista de Emilia-Romagna (Bologna), na Itália, onde mais de 45% do PIB vem de cooperativas, e que possui um padrão de vida que é o dobro do restante da Itália, e um dos maiores da Europa. As economias e companhias Distributistas têm uma vantagem competitiva inerente sobre suas contrapartes capitalistas e socialistas, assim como benefícios sociais e comunitários que o capitalismo e o socialismo não conseguem desenvolver.